Desde a primeira noite na casa, Miguel sentiu algo estranho. As paredes pareciam sussurrar segredos antigos, e o chão de madeira rangia como se pisoteado por pés invisíveis. Ele descartou essas sensações como produto de sua imaginação fértil, focando-se em seu trabalho.

Personagens de seus livros começaram a aparecer, primeiro como sombras fugazes nas extremidades de sua visão, depois como figuras tangíveis que falavam com ele. Um deles, o vilão de seu romance mais recente, um sádico assassino chamado Victor, apareceu ao pé de sua cama, sorrindo maliciosamente.

— Você achou que podia me controlar, Miguel? —, sussurrou a figura mal encarada, sua voz um eco gelado no quarto escuro.

O escritor racionalizando, convenceu-se de que estava sonhando ou que era vítima do estresse. Mas as aparições se tornaram mais frequentes e intensas. Figuras que ele havia criado para aterrorizar seus leitores agora o perseguiam. Eles apareciam nos espelhos, refletidos com olhos vazios e sorrisos macabros. Cochichavam em seus ouvidos, recontando as histórias de terror que ele mesmo escrevera.

Miguel se trancou em seu escritório, tentando encontrar uma saída. Escrevia furiosamente, acreditando que poderia controlar as visões ao concluir uma nova história. Mas as palavras no papel tomavam vida própria, e ele já não tinha poder algum sobre elas.

Certa noite, enquanto escapava de Victor, encontrou uma passagem oculta na casa. Desceu por uma escada estreita e úmida que o levou a um porão escuro, onde descobriu um antigo livro. Compreendeu que a casa era um ponto de convergência entre o real e o imaginário, e que ele havia liberado os horrores de sua mente.

Desesperado, começou a ler buscando uma forma de reversão, esperando que isso encerrasse o pesadelo. As figuras aos poucos desapareceram..

De volta à superfície, a casa estava silenciosa novamente, mas Miguel não. As visões cessaram, mas ele sabia que a linha entre ficção e realidade havia sido para sempre comprometida. Cada palavra que escrevia agora era um portal potencial, e ele vivia com o medo constante de libertar novas criaturas.

Decidiu abandonar o terror e começou a escrever histórias de esperança, no intuito de manter os monstros à distância. Mas, em cada suspiro noturno, ele sentia a presença deles, lembrando-lhe que o verdadeiro terror não está no que contamos, mas naquilo que não podemos controlar.